09 dezembro, 2010

03 dezembro, 2010

Agora é a vez do Exame para Alfabetização...


Não bastassem os exames profissionais, agora também chega o exame para aferir a alfabetização das crianças. Mas só no ano que vem. O governo atual não quer se comprometer com esses dados. Veja a notícia na íntegra:

"O Brasil terá uma nova prova para avaliar o nível de alfabetização dos alunos do 3.º ano do ensino fundamental - série em que, com 8 anos de idade, deveriam saber ler e escrever. O exame é uma parceria entre o Movimento Todos Pela Educação, a Fundação Cesgranrio, o Instituto Paulo Montenegro (do Ibope) e o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), ligado ao Ministério da Educação.

A prova ainda não tem nome oficial, mas é chamada pelos organizadores de ‘Inafinho’, em alusão ao Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf), que mede o nível de alfabetismo funcional da população adulta. O ‘Inafinho’ não deve substituir avaliações já existentes - a ideia surgiu, segundo os organizadores, porque hoje não há um monitoramento público que avalie em que patamar está a alfabetização das crianças dessa faixa etária (leia mais ao lado). A alfabetização até os 8 anos é uma das metas do Todos Pela Educação.

A prova deveria ser aplicada até o fim deste ano, mas isso não foi possível pelo prazo apertado e por causa da transição de governos. Ainda não há data definida, mas, segundo o Estado apurou, o ‘Inafinho’ deve ocorrer entre a segunda e a terceira semana de aula de 2011, para as crianças que acabaram de sair do 3.º ano - ou seja, que estão no 4.º. Repetentes também serão incluídos.

Devem participar cerca de 500 turmas de escolas públicas e particulares, de forma amostral - uma média de 5 mil alunos -, apenas de capitais brasileiras. A prova tem 20 questões de português, 20 de matemática e redação. A duração será de 1h30, meia hora para cada parte. Cada aluno deve fazer uma das provas, mas todos fazem a redação.

Os resultados devem ser apresentados por regiões. Será a primeira vez que o Brasil terá noção de como caminha a alfabetização de seus alunos, mesmo que em escala pequena. “Estamos em fase de pré-teste, mas a prova está pronta”, afirma Priscila Cruz, diretora executiva do Todos Pela Educação. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo".


Fonte: Agência Estado

01 dezembro, 2010

Exames de Habilitação para Exercício Profissional


Parece uma tendência que não tem volta. Várias categorias profissionais estão exigindo (algumas ainda em fase de projetos de lei) que os acadêmicos saídos das faculdades sejam submetidos a exames de habilitação profissional. O mais conhecido era o Exame da Ordem dos Advogados do Brasil, a OAB. Agora, a profissão dos contabilistas já terá no próximo ano seu primeiro exame de habilitação. Mas, não para por aí. Já tramitam projetos de lei para que sejam realizados exames de habilitação também para o curso de Medicina. São os projetos de lei nº 650/2007 e999/2007 dos deputados Ribamar Alves(PSB-MA) e Marcos Medrado (PDT-BA) respectivamente.
Contudo, a pergunta é: qual a motivação para se instituir tais exames de habilitação? Se o ensino nas faculdades é ruim, por que os órgãos públicos responsáveis pela educação não tomam providências reais para melhorá-lo? Se estão se proliferando muitos cursos superiores de qualidade questionável, por que não se "aperta" a liberação e o reconhecimento dos mesmos? Essa inércia só favorece o engodo e economicamente os donos de cursos preparatórios e das más faculdades, sem falar da ilusão que se tem nas faculdades de que se está aprendendo alguma coisa.
Voltando à Medicina, será que já não basta o funil que é a prova para a residência médica com todas as suas implicações boas e más? O Simepe, sindicato dos médicos, propõe que ao invés de um exame de habilitação seja feita uma avaliação séria aplicada a cada ano durante os seis anos da faculdade de medicina. Se é uma boa saída, só o tempo dirá. Enquanto isso, continuam tramitando os projetos no Congresso Nacional.

23 novembro, 2010

NÃO PERCA A CHANCE


Às vezes alguém perde uma oportunidade e fica se lamentando pelo resto de sua vida. Mas, e quando a perda dessa chance é provocada por outrem? Será que pode se tentar remediar o prejuízo de alguma forma? Talvez muitos não saibam, mas isso, no direito, se chama responsabilidade civil. As reparações de danos mais conhecidas na responsabilidade civil são as advindas por danos materiais e morais. Dentro das possibilidades dos danos morais existe a reparação pela perda de uma chance. Mais do que uma possibilidade ou teoria, isso é prática possível também no Brasil.
A perda de uma chance é uma teoria difundida pelos tribunais franceses, por isso perte d’une chance, que aplicaram e aplicam as regras da responsabilidade civil em casos envolvendo médicos.
A decisão inaugural de tal teoria ocorreu na jurisprudência francesa na 1ª Câmara da Corte de Cassação, por ocasião da reapreciação de caso julgado pela Corte de Apelação de Paris, em julho de 1964. O caso descreveu a acusação e posterior condenação de um médico ao pagamento de uma pensão devido à verificação de falta grave contra as técnicas da medicina, considerado desnecessário o procedimento que adotara, consistente em amputar os braços de uma criança para facilitar o parto. Destarte, a corte francesa considerou haver um erro de diagnóstico, que redundou em tratamento inadequado.
Entendeu-se, logo em sede de 1ª instância, que entre o erro do médico e as graves consequências, ou seja, a invalidez do menor, não se podia estabelecer de modo preciso um nexo de causalidade. A Corte de Cassação assentou que presunções suficientemente graves, precisas e harmônicas podem conduzir à responsabilidade. Tal entendimento foi acatado a partir da avaliação do fato do médico haver perdido uma chance de agir de modo diverso, condenando-o a uma indenização de 65.000 francos.
Diante de tal precedente, a doutrina estrangeira passou a reconhecer a teoria da perda de uma chance como válida e existente. Na Itália, muitos foram os estudos e avanços da doutrina que passou a reconhecer a possibilidade de se indenizar pela chance perdida, sempre que pudessem ser consideradas atuais, sérias e reais as oportunidades de obtenção de certa vantagem, que já existia no patrimônio da vítima no momento da lesão.
No Brasil, a teoria da perda de uma chance na responsabilidade civil surge, atualmente, como uma nova categoria de dano indenizável. São exemplos, a decisão proferida pela 14ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, cujo relator da apelação, Sérgio Jerônimo Abreu Silveira condenou uma empresa que atua na área de coleta e armazenamento de células-tronco a indenizar um casal por não ter recolhido células-tronco do cordão umbilical da sua filha, nascida de cesariana em uma maternidade do Rio de Janeiro. A condenação publicada em março de 2009, não seria diferente dos milhares de recursos proferidos pelos tribunais no país, no tocante a contratação de um serviço e seu inadimplemento, bem como os danos relativos à responsabilidade civil, se não fosse pela vertente peculiar sobre a responsabilidade civil envolvendo a teoria da perda de uma chance.
Também em 13 de março de 2006, foi publicada mais uma decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça acerca desse tipo de responsabilidade civil. A 4ª Turma, sob relatoria do ministro Fernando Gonçalves, condenou uma empresa responsável pela produção de um programa televisivo de entretenimento a indenizar o autor que teve frustrada sua expectativa de ganhar um prêmio de um milhão de reais, em razão da formulação imprecisa de uma pergunta e resposta.
Considerações doutrinárias a parte, bem como a colação das jurisprudências já produzidas na justiça brasileira, não seria esta uma possibilidade para também responsabilizar e condenar o Ministério da Educação pelos possíveis danos causados aos estudantes que poderão perder futuras oportunidades devido aos prejuízos que tiveram pelos erros consecutivos nos exames do Enem? Além disso, não poderiam também os bacharéis de direito responsabilizar a OAB e o Cespe pelos prejuízos que tiveram ao não poderem ingressar nos quadros da Ordem e exercer a advocacia, sem falar dos prejuízos psicológicos, simplesmente pelo fato de várias questões serem extremamente mal elaboradas, como ocorreu no ano de 2009, ou como ocorre quase todos os anos, responsabilizar empresas aéreas e a Infraero por atrazos e cancelamentos caóticos nos aeroportos brasileiros?
Como diz o ditado popular, às vezes “chances, algumas, só se tem uma vez na vida”. Assim, mais do que agir de forma impensada e materialista, vários setores da sociedade deveriam também observar seriamente que, dano não é apenas aquilo que se perde, mas também aquilo que se deixa de ganhar. Aí fica uma fundamentação jurídica para a possibilidade de se endireitar um pouco o Brasil.

17 outubro, 2010

Antígona de Sófocles, um resumo sobre o antigo dilema da Justiça.

por José Lourenço Torres Neto

“Parece preferível uma sociedade de celerados tementes à lei, como diria Kant, a uma sociedade de santos que viram a luz, pois estes só seguem a luz que descobriram” (ADEODATO, 2009, p.3).


No período clássico, as tragédias descreviam Thémis e Diké como concepções distintas de justiça, tal qual na tragédia grega de Sófocles (496–406 a.C.), a Antígona. Esta obra-prima é o marco do surgimento da idéia generalizada de direitos subjetivos independentes e acima do direito positivo, que por um longo período foi difundida e posteriormente internalizada nas constituições liberais. Drama porque estas entidades que corporificam duas posições concebidas como legais se embatem dentro da alma humana dos personagens da narrativa e os obrigam a tomar uma posição excludente. De logo entenda-se Thémis, a partir do condensado dessa trágica história e de alguns precedentes culturais, como um conjunto de leis divinas, entendidas também como “naturais”, e Diké como um conjunto de leis humanas, e ainda, segundo aquele imaginário grego, a opção por uma poderia constituir a exclusão da outra. Atualmente, contudo, ainda que por um longo período o jusnaturalismo tenha seguido distante do legalismo, a evolução do direito proporcionou um encontro menos subvertido para ambos por meio de ponderação e tolerância, efetivando complementarmente, a dignidade humana.

Embora a essência legal observada se concentre, em sua plenitude, nas linhas da Antígona, o relato histórico, se é que se pode chamar de história a descrição de “fatos” dentro de uma obra literária escrita para o teatro grego, se inicia na narrativa de outra obra, Édipo Rei. Este drama será vivido por Antígona, filha de Jocasta com Édipo, seu pai e irmão, sendo neta do amaldiçoado transgressor Laio, filho de Lábdaco. Vale ressaltar como curiosidade que a Antígona foi escrita em 444 a.C., logo, antes de Édipo Rei, que foi escrito em 430 a.C. (JEBBS, 2008, p. 17).

Édipo foi um típico herói trágico. Sendo ingênuo acerca de sua realidade e indefeso diante de seu destino, sobre ele pairou o justificável e legítimo argumento de ignorar a verdade sobre suas origens e nada poder fazer para fugir de seu inescapável destino, premissa cultural da obra, que foi profetizado pelo oráculo de Apolo em Delfos, qual seja, o de matar seu pai e desposar sua mãe, incorrendo numa irreversível transgressão à ordem natural e trazendo sobre si um pecado familiar e sua conseqüente maldição.

Percebe-se, portanto, que, naquela visão grega, tais transgressões infringiam leis naturalmente impostas pela divindade no coração humano. Daí, tais ações foram consideradas verdadeiras aberrações já que, uma vez desposando a própria mãe, tornar-se-ia irmão e pai de seus filhos, como veio a acontecer, fusão de posições inconcebíveis para a natureza. O desfecho de tal tragédia foi que Édipo não suportou a revelação de tamanha desgraça e diante da imensidão de seu infortúnio, estando Jocasta também morta, furou os próprios olhos e retirou-se da cidade (SOFOCLES, 2008, p. 70). Antígona o amparou em todo o seu exílio de Tebas até a sua morte, como filha passional, solidária e companheira que sempre foi.

Porém, Antígona possuía mais uma irmã, a ponderada e razoável Ismênia, e ainda dois outros irmãos: Polinice e Eteócles. Estes últimos foram amaldiçoados pelo próprio pai que rejeitaram, Édipo, e destinados a morrer um pelas mãos do outro, o que não deixou de ocorrer, já que se rivalizavam pela posse do trono vazio: Etéocles, a favor do tio Creonte, e Polínice, pleiteando reaver para si o trono que fora de seu pai, colocou-se contra Tebas. O fratricídio foi sangrento e não outro o resultado, extinguiram-se reciprocamente.

Com o trono vazio e sem os sucessores naturais para pleiteá-lo, Creonte se impôs como déspota de Tebas, e personificando a tirania, se apropriou, em benefício próprio, da Diké, as leis escritas, para se manter no poder. Por elas, prestou honras fúnebres a Etéocles, seu aliado, mas proibiu, sob pena de morte, que o corpo de Polínice fosse sepultado, obrigando os restos daquele que selou aliança com os argivos para conquistar o poder em sua terra a ficarem expostos às aves carniceiras, justificando e legitimando seus atos, repita-se, pelo apego férreo à "manipulável" lei dos homens (SÓFOCLES, 2008, p. 89).

Antígona, com seu comovente amor fraternal, considerou injusta tal proibição e decidiu prestar a seu irmão o piedoso serviço de enterrá-lo, uma vez que, de acordo com os preceitos olímpicos, muito mais importantes que a morte em si, era a honra da sepultura, o justo merecimento de, tendo sido benquisto neste mundo, obter a glória de ser bem recebido no outro. O direito à sepultura consistia na certeza de poder ter um enterro condigno, pagar a moeda ao barqueiro Aqueronte, fazer a travessia pelo Léthe, o rio do esquecimento, e poder chegar ao insondável reino dos mortos, onde Plutão e Perséfone imperavam, o misterioso Hades. Esse foi o heroísmo funesto de Antígona, pois, uma vez tendo sido descoberta sua desobediência, o rei Creonte a condenou a ser emparedada viva em uma caverna. As outras implicações da teimosia e apego do soberano à sua lei também foram trágicas. Mesmo cedendo ao fim, foi tarde demais, a heroína se enforcou. Seu filho Hêmon, apaixonado por ela, também se suicidou, e até Eurídice, mãe de Hêmon e sua esposa, inconformada com a morte do filho, igualmente deu cabo de sua vida (SÓFOCLES, 2008, p. 120).

Instaurou-se o conflito quando se relevou o telos (propósito, finalidade) da lei em prol da letra que beneficiava quem a aplicou. Confronto entre Thémis e Diké, a lei dos deuses e a lei dos homens, que só ocorreria quando esta última se impusesse desconsiderando a primeira, quando os preceitos humanos desconsiderassem os divinos, porquanto Thémis, imperativa, não violaria nem comprometeria a natureza do homem. Portanto foi Antígona mesma, passional e abstraída do torporoso poder, que ao refutar, em vão, a acusação de desobediência, selou seu destino:

CREONTE – [...] tiveste a ousadia de desobedecer a essa determinação?
ANTÍGONA – Sim, pois não foi decisão de Zeus; e a Justiça [Diké], a deusa que habita com as divindades subterrâneas, jamais estabeleceu tal decreto entre os humanos; tampouco acredito que tua proclamação tenha legitimidade para conferir a um mortal o poder de infringir as leis divinas [Thémis], nunca escritas, porém irrevogáveis; não existem a partir de ontem, ou de hoje; são eternas, sim! E ninguém pode dizer desde quando vigoram! Decretos como os que proclamaste, eu, que não temo o poder de homem algum, posso violar sem merecer a punição dos deuses! (SÓFOCLES, 2008, p. 96).

Certamente foi uma posição particular e com fundamento num argumento abolido pela maioria das leis dos Estados modernos, a auto-tutela. Sobre as conseqüências dessa postura é que, houve e sempre haverá questionamentos. Aqui, o dilema estava dissociado entre duas personagens, mas nos indivíduos, e em determinados sistemas legais, eles se embatem numa mesma entidade. Portanto, questões sobre os limites da autoridade do Estado, do direito positivo, sobre as leis do direito natural, as leis não escritas, não são um mero posicionamento sobre o que é certo ou errado, justo ou injusto. Ou seja, perguntar se Polínice deveria lutar pelo trono deixado por seu pai, na sucessão natural, algo seu por direito divino (Thémis) como acreditava, ou Creonte que agora rei, julgasse que devia aplicar suas leis (Diké) a qualquer inimigo de Tebas. No caso, os parâmetros retóricos são distintos e não fazem parte do mesmo silogismo, daí os resultados conflitantes e inconciliáveis. Contudo, aí surgiu claramente a idéia generalizada de direitos subjetivos independentes e acima do direito positivo que perdurou por eras. Aceitando-se esse conceito, de fato, qualquer lado que se escolhesse geraria a exclusão do outro. Daí a importância histórica da superação do binômio universalidade-relatividade tão crucial para entender que, neste dilema, poderia haver alternativas não excludentes, não desenvolvidas aqui.

Porém, Antígona não tinha dúvidas sobre qual lei seguir. Como qualquer herói do teatro grego, ela dominou o phobos, o medo. Destemida, ousada e indomável, atreveu-se a desafiar a tirania de seu tio Creonte e, mesmo ciente da pena de morte que seu ato implicaria, recusou-se em obedecer a leis civis, por achá-las inferiores aos desígnios divinos. Note-se que ela descreveu as primeiras obras de Creonte do início do drama como advindas de Thémis, embora, parciais: “[Creonte] sepultou a Etéocles, com todos os ritos que a justiça [Thémis] recomenda, garantindo-lhe assim um lugar condigno no Hades”, ação, que ela considerou, sagrada, pois “nenhum dos dois [Creonte e seu decreto] é mais forte do que o respeito a um costume sagrado” (SÓFOCLES, 2008, p. 84-85). Isso lhe deu mais força. Os interesses pessoais e sentimentos egoístas de Creonte que pensaram limitar o que era superior e mais amplo, não a afetaram. Pelo contrário, a trama demonstraria quão acertada foi a convicção que tomou. O convencimento de Creonte foi temporário, pois, embora inicialmente nem mesmo as palavras de seu filho, Hêmon, com insistentes tentativas, o tivessem dissuadido, ao final, ele mudou:

CREONTE – Miserável! O que te leva a divergir tanto do teu pai?
HÊMON – É que te vejo violar os ditames da Justiça!
CREONTE – E o que há de injusto em sustentar minha autoridade?
HÊMON – Não é vilipendiando os preceitos divinos que se sustenta a autoridade! (SÓFOCLES, 2008, p. 106).

Em adição a isso, ao sentimento de injustiça sobre aquele decreto humano, outros personagens se manifestaram na tentativa de convencer o rei; o Corifeu afirmou: “Eu, como muitos, sinto grande revolta contra esse decreto”, Antígona agonizou: “Vede como, ignoradas as súplicas dos meus amigos, iníquas leis me levam a um covil de pedra, a um túmulo de nova espécie!” (SÓFOCLES, 2008, p. 108-109). Mas, tudo continuou o mesmo até que o Destino, como representante da natureza, resolveu intervir. O velho adivinho cego Tirésias, usando de seus sortilégios, conseguiu impingir um pouco de bom senso, não sem ameaças místicas, ao rei tirano: “Errar é coisa comum entre os humanos, mas se o homem sensato comete uma falta, é feliz quando pode reparar o mal feito sem enrijecer em sua teimosia, pois esta gera a imprudência” (SÓFOCLES, 2008, p. 113).

Os interesses de Creonte mudaram e o custo de sua decisão e decreto agora o atingiram pessoal e subjetivamente. O destino foi implacável e como característica de uma tragédia de cujo desfecho nenhum bem se pode esperar, pois nela não existem escritas certas por linhas tortas, “um erro traz sempre um erro. Desafiado o destino, tudo será destino.” (SÓFOCLES, 2008, p. 121). Porém Antígona, que se posicionou sobre o que considerou superior, apesar do alto preço pago, despertou em todas as platéias, pelo menos, a ponderação sobre a legitimidade das leis dos homens.
Assim, a partir de Sófocles, o mito de Antígona ganhou em várias expressões culturais, o simbolismo de uma heroína, uma mulher capaz de assumir os valores éticos mais elevados, mesmo com o risco de sua própria vida. Posteriormente, também, a narrativa tornou-se um símbolo de resistência às tiranias por representar a contradição que condenava a sociedade grega à morte mediante a tensão entre os valores morais da cidade-estado e os valores morais “naturais”. Contudo, foi no século XIX que ela ganhou uma interpretação abertamente política, no conflito entre leis escritas e não escritas, ou entre o indivíduo e o poder absoluto (JEBBS, 2008, p. 127).

Porém, como nenhum poder é absoluto permanentemente e o indivíduo condicionou-se a uma medida de submissão ao Estado, tanto um como o outro, para a plena eficácia da coexistência de ambos, tiveram que tomar como imperativo um alto grau de ponderação e tolerância, a fim de que não se cresse cegamente que qualquer conceito de fundamento ético, seja envolvendo direitos subjetivos, direitos humanos ou a dignidade da pessoa humana e que estivessem fora do direito positivo, por um lado, fossem considerados ilusórios e disfuncionais. Por outro, apesar daquilo que se percebe atualmente da leitura da Antígona e seus resultados, não se deveria lastrear qualquer intolerância no também ambíguo conceito de que o direito natural é o direito do “bem”, pois insurgido contra o direito positivo, enquanto este é o direito submisso ao “mal”, aos poderosos de plantão (ADEODATO, 2009, p.3).

Logo, coube ao direito positivado, absorver os conceitos subjetivos, ditos naturais, para dirimir qualquer conflito intelectual emanado da sociedade e estabelecer a base justa de sua legitimidade, pois as particularidades que porventura existam entre os diversos direitos não devem ser concebidas como antagônicas e excludentes, mas complementares à efetivação da dignidade humana. A Antígona não é base para um sistema jurídico paralelo, embora estes existam, mas exemplo de que, dilemas milenarmente resistidos podem se incorporar no universo do direito positivo.

REFERÊNCIAS
ADEODATO, João Maurício. A retórica constitucional (sobre tolerância, direitos humanos e outros fundamentos éticos do direito positivo). São Paulo: Saraiva, 2009.
JEBBS, Sir Richard. Perfil Biográfico, Comentários e Apêndice. In: SÓFOCLES, Édipo Rei/Antígona. Coleção obra prima de cada autor. Tradução de Jean Melville. v. 99. Martin Claret: São Paulo, 2008.
SÓFOCLES, Édipo Rei/Antígona. Coleção obra prima de cada autor. Tradução de Jean Melville. v. 99. Martin Claret: São Paulo, 2008.

13 julho, 2010

Estatuto da Criança e do Adolecente, já precisa mudar?

São 20 anos de Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e algumas modificações são sugeridas por muitos estudiosos do Direito. Contudo, ficaria satisfeito se, entre outras coisas, fossem aplicadas medidas já existentes e primordiais para os jovens como os itens que delineei na Cartilha de Direitos do Paciente Infantil, publicada na internet em vários sites eletronicos e que transcrevo a seguir:
1. A criança ou o adolescente doentes, e sua mãe, têm direitos a proteção à vida, à saúde e ao atendimento integral em condições dignas de existência.
2. Toda gestante tem direito a atendimento pré e perinatal através do SUS.
3. Toda gestante tem direito a ser atendida preferencialmente pelo médico que a acompanhou na fase pré-natal.
4. Toda gestante e a nutriz tem direito a alimentação provida pelo Poder Público.
5. Toda gestante, tem direito de amamentar seus filhos no local de trabalho e em instituições onde esteja submetida a medida privativa de liberdade (cadeia, prisão, etc).
6. Toda mãe tem o direito de ter alojamento conjunto com seu filho recém-nascido.
7. É dever dos hospitais e maternidades, manter prontuário das crianças até os 18 anos, identificar o recém-nascido e a mãe, proceder exames e orientações aos pais sobre o diagnóstico e o tratamento de suas crianças; bem como, fornecer declaração de nascimento.
8. Toda criança tem direito a receber gratuitamente medicamentos, próteses e outros recursos para tratamento, habilitação ou reabilitação.
9. Toda criança internada em estabelecimento de saúde tem direito a ter um dos pais como acompanhante em tempo integral.
10. Toda criança tem direito à vacinação obrigatória; assim como, a programas de assistência médica e odontológica pelo SUS.

Só com isso, na área de saúde, já seria um enorme avanço prático, o que dizer se fossem aplicadas as diretrizes sociais, educacionais e penais do ECA?

11 junho, 2010

NATUREZA ÍNTIMA

Augusto dos Anjos

Cansada de observar-se na corrente
Que os acontecimentos refletia,
Reconcentrando-se em si mesma, um dia
A natureza olhou-se interiormente!

Baldada introspecção! Noumanalmente
O que ela, em realidade, ainda sentia
Era a mesma mortal monotonia
De sua face externa indiferente!

E a natureza disse com desgosto:
Terei somente, porventura, rosto?
Serei apenas mera crusta espessa?

Pois é possível que Eu, causa do Mundo,
Quanto mais em mim mesmo me aprofundo,
Menos interiormente me conheça?

26 maio, 2010

Os Melhores Bens segundo Aristóteles

No livro II da Política de Aristóteles, ele classifica os bens da seguinte forma: "os da alma, os do corpo e os exteriores. Todos estes bens devem ser encontrados junto às pessoas felizes."
Sobre o consenso comum a respeito do equilíbrio destes bens ele continua: "A maioria, pensando que lhes basta ter um pouco de virtude, deseja ultrapassar infinitamente os outros em riqueza, em poder, em glória e outros que tais." Porém, continua, "não é pelos bens exteriores que se adquirem e conservam as virtudes, mas sim é pelos talentos e virtudes que se adquirem e conservam os bens exteriores."
Este não é um discurso moralista cristão, é um discurso civilizatório que mudou o mundo a mais de 23 séculos. Contudo, numa história mais recente, o egoísmo bárbaro tem buscado reacionariamente suas raízes malévolas, o que é uma vergonha para a civilização.
Todos devem recordar as palavras do mestre grego de que "os bens exteriores são apenas instrumentos úteis, conformes a seu fim, mas semelhantes a qualquer outro instrumento, cujo excesso necessariamente é nocivo ou, pelo menos, inútil a quem os manipula."
Assim, uma mente superior, instruida por um espírito elevado, deve buscar adquirir, usufruir e distribuir bens para que possa ser feliz junto com seus semelhantes.

23 maio, 2010

Direitos Naturais Superiores?

A partir de Sófocles, o mito de Antígona ganhou em várias expressões culturais, o simbolismo de uma heroína, uma mulher, capaz de assumir os valores éticos mais elevados, mesmo com o risco de sua própria vida. Posteriormente, também, a narrativa tornou-se um símbolo de resistência às tiranias por representar a contradição que condenava a sociedade grega à morte mediante a tensão entre os valores morais da cidade-estado e os valores morais “naturais”. Contudo, foi no século XIX que ela ganhou uma interpretação abertamente política, no conflito entre leis escritas e não escritas, ou entre o indivíduo e o poder absoluto (SÓFOCLES, 2008, p. 127).
Porém, como nenhum poder é absoluto permanentemente e o indivíduo condicionou-se a uma medida de submissão ao Estado, tanto um como o outro, para a plena eficácia da coexistência de ambos, tiveram que tomar como imperativo um alto grau de ponderação e tolerância, a fim de que não se cresse cegamente que qualquer conceito de fundamento ético, seja envolvendo direitos subjetivos, direitos humanos ou a dignidade da pessoa humana e que estivessem fora do direito positivo, por um lado, fossem considerados ilusórios e disfuncionais. Por outro, apesar daquilo que se percebe atualmente da leitura da Antígona e seus resultados, não se deveria lastrear qualquer intolerância no também ambíguo conceito de que o direito natural é o direito do “bem”, pois insurgido contra o direito positivo, enquanto este é o direito submisso ao “mal”, aos poderosos de plantão (ADEODATO, 2009, p.3).
Logo, coube ao direito positivado, absorver os conceitos subjetivos, ditos naturais, para dirimir qualquer conflito intelectual emanado da sociedade e estabelecer a base justa de sua legitimidade, pois as particularidades que porventura existam entre os diversos direitos não devem ser concebidas como antagônicas e excludentes, mas complementares à efetivação da dignidade humana. A Antígona não é base para um sistema jurídico paralelo, embora estes existam, mas exemplo de que, dilemas milenarmente resistidos podem se incorporar no universo do direito positivo.

REFERÊNCIAS
ADEODATO, João Maurício. A retórica constitucional (sobre tolerância, direitos humanos e outros fundamentos éticos do direito positivo). São Paulo: Saraiva, 2009.
SÓFOCLES, Édipo Rei/Antígona. Coleção obra prima de cada autor. Tradução de Jean Melville. v. 99. Martin Claret: São Paulo, 2008.

17 maio, 2010

Questão para estudo:

Responda e/ou deixe um comentário - será que existem leis superiores às leis civis porque são parte da natureza humana, se existem, foram colocadas no homem por Deus ou são uma herança genética? Ou todas as leis foram criadas pelo homem, e até as consideradas superiores foram ensinadas pela ética e moralidade coletiva?

12 abril, 2010

Local e Dicas para o Exame da Ordem (OAB) 2009.3

O Cespe/UnB já anunciou os locais de prova para a 2ª fase 2009.3. Para os que fazem na seccional PE é só clicar no link abaixo, e se precisar de algumas dicas é bom dar uma olhada no que o Dr Maurício Gieseler de Assis informou. Boa sorte!!
Locais de prova:
Dicas:

09 abril, 2010

Verdades sejam ditas sobre Exame da OAB

"Não dá para perder tempo se lamentando com a derrota no Exame de Ordem anterior, porque o campeonato ainda não terminou".


"Só não passa no Exame de Ordem quem desistiu ou porque não fez".


"Uns passam antes; outros, depois".


"O Exame de Ordem não é fim, no máximo, meio para se alcançar um objetivo maior que é a advocacia ou concurso público".


"A prova da OAB não pode ser propósito de vida de alguém, só para aqueles que querem uma desculpa para reclamar das dificuldades que é ser bacharel nos dias de hoje...".


"Alguém estudou numa faculdade cuja média de aprovação era 5 ou 50%?".


"Para passar precisa estudar toda a matéria? Quem disser que estudou tudo e não passou, por favor, não estamos precisando de novos políticos".


"Não precisa se estudar toda a matéria para passar na prova da OAB, até porque ela não se encontra em editais nem em faculdade de Direito".


"1/5 (um quinto) da aprovação está em apenas uma Lei (estatuto da advocacia), num regulamento geral da OAB e num Código de Ética".


"Acertando as 10 questões de ÉTICA, restarão apenas mais 40 questões das 90 que sobrarão... ou seja, um pouco mais de 40% da prova".


"Aluno meu já passou no Exame de Ordem com 44 questões, porque 6 foram anuladas".


"Muitos alunos não passaram por terem feito 49 acertos. Como já dizia Arnaldo Cezar Coelho, a regra é clara, porque 49 não é 50".


"Muita gente diz que prefere morrer dormindo, como também muitas outras dizem que preferem chorar por 40 acertos ao invés de 49".


"Trocar gabarito antes de passar para grade é separação certa, porque quando escolhemos uma alternativa é como fosse amor à primeira vista: abraçamos nela até a eternidade".


"O Exame de Ordem não separa o joio do trigo, mas serve de consolo para o futuro padeiro".


"Tem gente que não estuda Direito Ambiental, Internacional, ECA e Consumidor porque caem apenas duas questões cada. Errado! São 8 questões jogadas fora!".


"Quem não estuda Empresarial desculpa-se que são apenas 3 questões na prova. Sugiro sempre que perguntem a alguem que acertou 49 questões qual é o sentimento dele".


ps. este é um pequeno apanhado de frases que repito sempre aos nossos alunos sobre Exame de Ordem e espero que sirva alguma coisa para você!

Publicado no blog Habeas Data do Dr. Marcelo Hugo da Rocha
http://marcelohugodarocha.blogspot.com/2010/04/verdades-sejam-ditas-sobre-exame-da-oab.html

20 janeiro, 2010

Desenvolvimento educacional no Brasil é pior que no Paraguai, Equador e Bolívia

O relatório Educação para Todos, divulgado pela Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco) mostra que a baixa qualidade do ensino nas escolas brasileiras ainda deixa milhares de crianças para trás e é diretamente responsável por manter o país na 88ª posição no Índice de Desenvolvimento Educacional (IDE), atrás de países mais pobres como Paraguai, Equador e Bolívia. Em 2000, mais de 160 países assinaram o compromisso Educação para Todos, que previa o cumprimento de seis metas incluindo a universalização do ensino fundamental, a redução da taxa de analfabetismo e a melhoria da qualidade do ensino. (Leia mais: Maioria dos jovens não cursa o ensino médio)

A Noruega lidera o ranking da Unesco. Ela e mais 60 países estão no grupo daqueles que já cumpriram ou estão perto de atingir todos os objetivos firmados no compromisso.

Ao analisar o cumprimento das quatro principais metas estabelecidas pela Unesco, constata-se que o Brasil tem um bom desempenho no que se refere à alfabetização, ao acesso ao ensino fundamental e à igualdade de gênero. Mas tem um baixo desempenho quando se analisa o percentual de alunos que conseguem passar do 5° ano do ensino fundamental.

O relatório aponta que o Brasil apresenta alta repetência e baixos índices de conclusão da educação básica. Na região da América Latina e Caribe, a taxa de repetência média para todas as séries do ensino fundamental é de 4,4%. Mas no Brasil, o índice é de 18, 7% - o maior de todos os países da região.

Da Agência Globo

10 janeiro, 2010

Pensamento educativo:

"Um professor trabalha para a eternidade; ninguém pode dizer onde acaba sua influência."
Henry Brooks Adams