16 dezembro, 2015

Voltaire ou Evelyn?

Na camiseta (preta) dos formandos de minha turma de Direito escrevemos uma frase que (ingenuamente) creditamos ao filósofo francês Voltaire, e ela é bem conhecida pelo público em geral, se constituindo um verdadeiro topoi jurídico: Posso não concordar com o que você diz, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-lo.
 
Anos depois, entre meus colegas de Mestrado na UFPE, conheci o Professor Joelson Vale que, numa conversa informal, e em várias preleções em que tive a oportunidade de ouví-lo, afirmou que tal frase não era de Voltaire. Advertido que fiquei, se já havia caído na imprecisão no caso da "camiseta", apesar de respeitar muito as fontes do colega, resolvi ser um pouquinho mais cauteloso. Pesquisei. E, encontrei uma publicação de Ivan Bilheiro, que transcrevo em parte, a fim de divulgar o "conhecimento".
 
"a tão citada frase foi elaborada por uma biógrafa de Voltaire, em uma obra do início do século XX, portanto, bem distante do período de vida e produção do filósofo francês. Em um livro de 1906 chamado The friends of Voltaire ("Os amigos de Voltaire" - tradução livre), publicado em Londres pela Smith, Elder & Co., a escritora Evelyn Beatrice Hall (1868-c. 1939), que durante um tempo usou o pseudônimo S. G. Tallentyre, trata de dez figuras notáveis com quem seu biografado, de alguma forma, se relacionou. São eles: D'Alembert, Diderot, Galiani, Vauvenargues, D'Holbach, Grimm, Turgot, Beaumarchais, Condorcet e Helvétius. É na parte dedicada a este último que a biógrafa apresenta a frase "I disapprove of what you say, but I will defend to the death your right to say it" ("Eu discordo do que você diz, mas vou defender até a morte seu direito de o continuar dizendo", em tradução livre). Talvez por uma questão de estilo, Evelyn Hall colocou a frase entre aspas e a construiu em primeira pessoa, o que acabou gerando a confusão e a falsa atribuição. Mas, de fato, a intenção da escritora era resumir o posicionamento que Voltaire teria adotado com relação ao banimento de um livro de Claude-Adrien Helvétius (1715-1771), outro filósofo francês com quem ele teve certo desacordo. Em 1758, Helvétius publicou o livro De l'espirit, o qual foi condenado pela Sorbonne, pelo Parlamento de Paris e até pelo Papa, chegando a ser queimado. Apesar do desacordo explícito com relação ao pensamento de Helvétius, Voltaire não acreditava que o banimento daquele livro fosse um ato correto. Foi a atitude de Voltaire frente a esta situação que Evelyn Hall tentou resumir com sua frase, inadvertidamente escrita entre aspas e em primeira pessoa”.
 
 
Fica aí a dica. Obrigado Joelson. Obrigado Ivan.