23 maio, 2010

Direitos Naturais Superiores?

A partir de Sófocles, o mito de Antígona ganhou em várias expressões culturais, o simbolismo de uma heroína, uma mulher, capaz de assumir os valores éticos mais elevados, mesmo com o risco de sua própria vida. Posteriormente, também, a narrativa tornou-se um símbolo de resistência às tiranias por representar a contradição que condenava a sociedade grega à morte mediante a tensão entre os valores morais da cidade-estado e os valores morais “naturais”. Contudo, foi no século XIX que ela ganhou uma interpretação abertamente política, no conflito entre leis escritas e não escritas, ou entre o indivíduo e o poder absoluto (SÓFOCLES, 2008, p. 127).
Porém, como nenhum poder é absoluto permanentemente e o indivíduo condicionou-se a uma medida de submissão ao Estado, tanto um como o outro, para a plena eficácia da coexistência de ambos, tiveram que tomar como imperativo um alto grau de ponderação e tolerância, a fim de que não se cresse cegamente que qualquer conceito de fundamento ético, seja envolvendo direitos subjetivos, direitos humanos ou a dignidade da pessoa humana e que estivessem fora do direito positivo, por um lado, fossem considerados ilusórios e disfuncionais. Por outro, apesar daquilo que se percebe atualmente da leitura da Antígona e seus resultados, não se deveria lastrear qualquer intolerância no também ambíguo conceito de que o direito natural é o direito do “bem”, pois insurgido contra o direito positivo, enquanto este é o direito submisso ao “mal”, aos poderosos de plantão (ADEODATO, 2009, p.3).
Logo, coube ao direito positivado, absorver os conceitos subjetivos, ditos naturais, para dirimir qualquer conflito intelectual emanado da sociedade e estabelecer a base justa de sua legitimidade, pois as particularidades que porventura existam entre os diversos direitos não devem ser concebidas como antagônicas e excludentes, mas complementares à efetivação da dignidade humana. A Antígona não é base para um sistema jurídico paralelo, embora estes existam, mas exemplo de que, dilemas milenarmente resistidos podem se incorporar no universo do direito positivo.

REFERÊNCIAS
ADEODATO, João Maurício. A retórica constitucional (sobre tolerância, direitos humanos e outros fundamentos éticos do direito positivo). São Paulo: Saraiva, 2009.
SÓFOCLES, Édipo Rei/Antígona. Coleção obra prima de cada autor. Tradução de Jean Melville. v. 99. Martin Claret: São Paulo, 2008.

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